Oradas
de Portugal
Em 1954º Pe. José Manuel
Semedo Azevedo, da Diocese de Faro, com o apoio do seu bispo de então
D.Marcelino António Maria Franco, percorreu o pais, desde Melgaço no Alto Minho
até Albufeira no Algarve, onde num estudo aprofundado, sobre as catorze Oradas
de Portugal, resulta a edição do livro “ Nossa Senhora da Orada, seu culto na
história de Portugal”.
Da Orada de Melgaço, a quem o autor dedica
15 páginas do seu livro, descobre em documentos antigos que nos reportam ao
início da nacionalidade, invocando a forte devoção dos cavaleiros franceses,
que terão trazido essa devoção á SSma. Virgem.
Ainda no Minho o Pe. Azevedo percorreu a
história de mais três Oradas, Pinheiro- Vieira do Minho, e em Cabeceiras de
basto as Oradas de Refojos e da Cucana. Uma paragem em S. Vicente da Beira,
para descrever mais uma Orada, e na sua viagem para sul mais outra paragem em
Ferreira do Zêzere, onde este sacerdote encontra a Orada do Beco, cuja
fotografia é a que mais se assemelha á de Pinheiro. Vem a seguir a Orada de
Sousel com uma linda história que envolve o santo condestável D. Nuno Alvares
Pereira, a quem o autor descreve a sua bandeira, como Orada flutuante. Segue a
Orada de Ourém, e a de Aviz cujo santuário é a igreja Matriz daquela terra.
Ainda no Alentejo encontramos a Orada de Borba e a de Monsaraz, e a seguir a
Orada do Baixo Alentejo, que se venera numa pequena capela, e que dá nome a uma
grande mina de ferro, que nos seus 200 metros de galerias se extraia em 1954,
ferro de grande qualidade e ao que parece desde o tempo dos romanos. Por último
o Pe. Azevedo dedica 22 páginas do seu livro, narrando a linda história da
Orada de Albufeira situada no extremo sul do país, completando assim as catorze
Oradas de Portugal. Chama a atenção uma passagem desta obra, onde o autor diz
referindo-se á Orada do Baixo Alentejo: “ Em Outubro de 1955 depois de ter
percorrido todos os santuários de Nossa Senhora da Orada, contando assinalar
este no numero dos que desapareceram na viragem do tempo, desembarcamos em Beja
e fomos encaminhados para Pias ou Serpa…” Deduz – se portanto que além das
catorze terão havido outras que desapareceram na voragem do tempo. (Expressão
do autor)
A Orada de Pinheiro
Depois de descrever o pitoresco lugar de
encanto, em que se situa este Santuário, o Pe. Azevedo dedica na sua obra12
paginas á historia desta secular confraria, baseado nas informações, enviadas
pelo colega Pe. José Carlos Alves Vieira, que consultou os livros antigos,
sobretudo os estatutos de 1683, 1869 e 1897. Diz o autor na página 39. É muito
antigo o culto a Nossa Senhora da Orada aqui. A sua festa anual é a mais concorrida
do Concelho, como nos foi confirmado pelo Reverendíssimo Cónego Arlindo da
Cunha, a antiga Orada de Pinheiro era uma pequena Ermida. A grande capela
atual, começou a ser construída para Nossa Senhora da Guadalupe, como porém o
culto a Nossa Senhora da Orada, era muito intenso aqui, ficou sempre conhecida
como a capela de Nª Sra. Da orada.
Destaca
se alguns dos artigos e parágrafos contidos nesses estatutos:
Assim os de 1869 que foram assinados pelos
Padres João Baptista Vieira de Vilarchão, Domingos José Martins Oliveira de
Pinheiro, José Manuel Fernandes Cardoso de Vilarchão e José Joaquim Alvares dos
Reis de Vilarchão, previam a eleição da mesa no 3º domingo de Maio, em
assembleia geral. Previam também o lugar de mordomo da cera que era renumerado,
e que entre outras atribuições analisava os requerimentos dos pretendentes a
empréstimos e sob as garantias de segurança que a confraria fazia com escritura
e hipoteca, e que de uma vez emprestou a um tal Manuel Matos Vieira, quatro
contos de rei. Também o servo andador, que tinha o encargo de angariar irmãos,
e que por cada angariado tinha o ordenado de 150 reis. Havia também o
cartorário que vencia ordenado estipulado pela mesa, podendo aumentar ou
diminuir, segundo o inventário. Não são especificadas as atribuições, mas penso
tratar se de uma espécie de gestor.
No seu 11º artigo estes estatutos
mantinham a admissão de irmãos apenas maiores de 21 anos com boa conduta moral
e religiosa, tal como os de 1683, tendo os estatutos de 1897 uma ligeira
alteração, em que menores de 20 anos podiam ser irmãos, desde que sua admissão
fosse solicitada por seus pais ou tutores. No artigo 13º ficava a mesa obrigada
a aplicar em beneficência uma decima parte da sua receita ordinária pela forma
indicada pelo senhor governador do distrito. E no 1º Paragrafo do mesmo artigo,
obrigava a mesa a socorrer os irmãos incapacitados de angariar o sustento pelo
seu trabalho, podendo ainda a mesa deliberar socorrer os mais pobres e
indigentes mesmo que alheios á irmandade. Ainda no artigo 11º 2º parágrafo
ficava a mesa obrigada a subsidiar o ensino primário na freguesia, e doar um
décimo da sua receita á misericórdia mais perto que tivesse hospital. Veja se
já naquele tempo a preocupação com o ensino, e o dinheiro que envolviam todos
esses benefícios, para além do sufrágio das almas, que beneficiavam de 80
missas no ano, mais as missas de corpo presente celebradas por 8 padres, e com
direito á presença da bandeira (propriedade da irmandade).
Estes
estatutos de 1869 dizem na última pagina, capítulo único, ficam revogados os estatutos
anteriores (1863) e todos os termos e deliberações desta irmandade, pelos quais
até ao presente ela se regulou, e determinamos o cumprimento do novo
compromisso depois de aprovado pelo Governo de sua majestade fidelíssima, a
quem submissos rogamos a sua confirmação. Capela de Nª Sra. Da Orada Pinheiro-
Vieira do Minho em assembleia geral em 31 de Janeiro de 1869.
Verifica- se que foi ao Rei D. Luís que
foi dirigida essa petição, e quem confirmou a provisão destes estatutos.
Constata - se que depois de 186 anos em
vigor, uns estatutos com tantos benefícios aos irmãos, tinha esta confraria de
ser muito rica, como descreve o autor das Oradas de Portugal, mas é a partir
daqui que começa a má gestão, pois 28 anos depois há necessidade de rever os
estatutos, onde numa assembleia geral realizada em 19 de Dezembro de 1897, se
pedia a diminuição de benefícios e sufrágios, mas que o governador civil
Visconde da Torre só aprovou em 21 de Agosto de 1900 e o Senhor Arcebispo D.
Manuel Baptista da Cunha em 13 de Dezembro do mesmo ano.
Estes estatutos foram assinados pelos
Padres António Joaquim da Rocha de Pinheiro, Francisco José Vieira de Araújo de
Vila Seca, Francisco António Cardoso do Mosteiro, António Martins Oliveira de
Pinheiro e Domingos Augusto Vieira da Mota de Pinheiro.
Procurei sem sucesso, encontrar algo que
justificasse a origem da riqueza desta confraria, no período de 186 anos que
decorreram entre 1683 e 1869. Terá sido herança de algum irmão ou irmãos ricos
oferecidos á irmandade? È o mais provável. Também não existem livros de
contabilidade ou atas que permitam saber nomes dos maus gestores que no final
do seculo 19 e princípios do seculo 20, com a entrada da Republica que dá a
”ultima machadada” como diz o autor Pe. Azevedo.
Terão os livros desaparecido
propositadamente, e não se lavravam atas? É que só a partir da década de 60 do
seculo 20 é que há estes registos.
Ex-Votos
A casa da cera, está recheada de centenas
de peças de cera, cabeças, pernas, braços, cirios, etc, e ao longo dos anos,
milhares se perderam. Há pelo menos três relíquias que sem nenhum valor
monetário, encerram em si um inestimável valor histórico e o de maior vulto é
sem dúvida um véu de cálix, que já andou muitos anos desaparecido e que a mesa
de 1987 a 1989 recuperou. Este véu de cálix, impresso na tipografia de António
Simões Ferreira em 1746 em Coimbra, e cujo teor, duma tese de doutoramento
sustentada por Miguel Ribeiro Luis, um filho da terra do lugar de Vilela,
escrita em latim, apesar dos seus 268 anos, encontra se perfeitamente visível,
e está traduzida em português nos livros “Oradas de Portugal”, “Vieira do
Minho”, “Monografia da Orada de Pinheiro” e “Senhora da Orada de Pinheiro” dos
autores Pe. José M. Semedo Azevedo, Pe. José Carlos Alves Vieira, Pe. Artur
Jorge Ramalho Gonçalves, e Prof. Manuel Leite Rebelo, respetivamente.
Também de valor histórico duas tábuas
cerca de 20x30cm, cada uma com a sua pintura tosca. Diz uma: “Milagre que fez
Nª Srª de Guadallupe ao Pe. Domingos António LLuis do LLugar de Vilella
Freguesia de Pinheiro que vendose Nogolfo Delião vindo de Romma em grave prigo
de vida, envocou desta Srª epor sua emtercesão llogo se viu livre Ano de 1792”.
Vê-se neste quadro a pintura de um padre paramentado diante da imagem da Srª da
Guadalupe.
No outro quadro vemos a figura de um homem
ajoelhado diante da imagem de Nossa Senhora da Orada, com o chapéu no chão e de
mãos postas, que escreveu esta inscrição: “Milagre que fez Nª Sra da Orada, a
Agostinho VIV, de Vilella que estando em artigo de morte a Senhora o restituio.
ANNOde 1859.”
Também uma trança de cabelo que segundo
testemunhos, deve ter pelo menos 150 anos, faz parte dos ex-votos desta
confraria.
Quem
visita o santuário, repara que no seu piso de granito, existem duas pedras
salientes, cerca de 5cm; consta que cada uma delas assinala a sepultura de uma
criança da casa de Afonso de Vilarchão.
Uma mesa de granito com bancos, que hoje
se encontra na parte lateral sul, que ocupou o lugar do coreto até 1967, altura
em que a mesa de então presidida por
Domingos José da Costa, a mudou, tem uma inscrição que diz:” ESTA MESA
MANDOU FAZER ANTÓNIO RAMALHO DO PORTO ANNO DE 1682.”
Um fontenário artístico, jorrando água
muito fresca, todo o ano junto ao santuário faz parte do belo lugar, que conta
com a casa da confraria, renovada e com projeto alterado e aumentado, bem
enquadrada no local, ao contrário de um palco mal enquadrado, mas de grande
utilidade.
Ao entrar nos recintos do santuário, um
terreno vedado, onde debaixo dum penedo está outro refrescante nascente, foi
construído um fontenário que tem data de 1868, e é esta fonte que dá origem á
lenda onde segundo a tradição apareceu Nossa Senhora da Orada á jovem para ali
degradada por uma suposta gravidez que não era verdadeira.
No alto do monte, hoje parque propriedade
da confraria uma pequena capela, onde anualmente a procissão vai dar a volta e
se desfruta de um panorama maravilhoso, essa capela é chamada de calvário.
No início da década de 40 do seculo XX,
presidia á mesa da confraria o Senhor Armindo Martins Oliveira da casa de
Pinheiro, havia necessidade urgente de forrar o Santuário, o Mundo estava
envolvido na maior guerra de sempre na história da humanidade, a 2ª guerra
mundial, havia falta de tudo, e até os pregos não eram exceção. Os lavradores
em reunião, decidiram oferecer a madeira, e um competente carpinteiro Adelino
Joaquim Vieira Mendes chefiou a equipe que se propôs forrar gratuitamente o
Santuário. E pregos? Não havia, e então ficou decidido que todos os
Pinheirenses, arrancassem nas suas casas, e nas propriedades que tinham
cancelas, todos os pregos que achassem menos necessários e os levassem aos
carpinteiros que depois de os endireitar, os aplicaram no forro, que só foi
substituído em 1988.
Outro fato curioso na história desta
confraria que mereceu atenção é este: Já com a confraria completamente
descapitalizada, pela última machadada desferida pela entrada da Republica,
presidia á mesa gerente, um lavrador modelo assim o descreveu seu irmão o Pe. José
Carlos Alves Vieira, nas informações dadas ao colega Pe. Azevedo, o Sr. António
Alves Vieira, que presidia á mesa, vendo a necessidade, de renovar o telhado do
Santuário, ate então na telha antiga, reduz o orçamento dos gastos com o
arraial, introduz o uso das novenas, e como exímio tocador de violino, pede a
colaboração da D. Elvira Miranda, que ao piano, com as vozes do coro, formaram
um ambiente festivo virado para o religioso em detrimento do cariz mais
profano.
De lembrar a D. Elvira Miranda era filha
do ilustre Pinheirense Francisco José de Miranda, “o Mirandinha” cujas obras na
pintura, escultura, música e outras são imortais.
Este trabalho foi feito com base no livro
“Oradas de Portugal” do Pe. Azevedo Semedo, da obra “Vieira do Minho”, do Pe.
José Carlos Alves Vieira, da “Monografia da Orada de Pinheiro” do Pe. Artur
Jorge Ramalho Gonçalves e ainda “Senhora da Orada de Pinheiro” do Professor
Manuel Leite Rebelo, e de relatos e lendas que ao longo da vida e das três
passagens pela mesa gerente da confraria, realizou para a Junta de Freguesia e
para a mesa gerente de 2014 a 2016, Adelino Mendes Gonçalves.
Nota:
já no final deste trabalho, soube-se que numa freguesia do concelho de Chaves
há mais uma Orada, que portanto escapou ao Pe. Semedo Azevedo.
Fotografias
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